Informativo
REDUÇÃO DE POSTOS DE TRABALHO: A TECNOLOGIA É ANTAGONISTA DA CLASSE TRABALHADORA?
Precisamos lutar por
um futuro onde o trabalho seja meio de emancipação em não servidão
Por
Cristiane Ganaka*
O debate sobre a redução dos postos de
trabalho em detrimento do desenvolvimento tecnológico não é de hoje e remete
aos tempos do ludismo, quando trabalhadores ingleses no início do século XIX
destruíram máquinas como forma de protesto.
De fato, a discussão retorna de tempos em
tempos, não por acaso, junto com as mudanças de paradigma produtivo. Será,
portanto, que a tecnologia é antagonista da classe trabalhadora?
O texto “A grande ruptura no mercado de
trabalho”, contido no livro “Pandemias, crises e capitalismo”, que acaba de ser
lançado pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), nos leva a
refletir sobre o assunto.
Os autores da obra, Rosa Marques, Marcel
Leite, Solange Berwig e Marcelo Depieri destacam no início do capítulo que não
está ocorrendo simplesmente um crescimento da automação dos processos das
atividades, mas mudanças qualitativas.
“A potencialidade que essa transformação
encerra em termos de poupança do trabalho humano é tal, que podemos dizer que a
oportunidade de trabalho tende a se restringir a poucos, ficando a imensa
maioria da população excluída das atividades organizadas pelo grande capital”.
EFEITOS DA TECNOLOGIA
Karl Marx já se preocupava com os efeitos do
desenvolvimento tecnológico dentro dos marcos capitalistas, como documentado
nos manuscritos “Fundamentos da Crítica da Economia Política”, e ao longo da
história – desde as observações feitas a partir da Primeira Revolução
Industrial – notam-se seus desdobramentos sobre o processo de trabalho, a
organização social e o meio ambiente.
Para entender a tecnologia e seus
desdobramentos sociais, precisamos contextualizá-la: o desenvolvimento
tecnológico se dá dentro do sistema capitalista, ou seja, está subordinado a
sua lógica de operação. Mas o que é tecnologia?
A tecnologia é apresentada como o novo, mas
ela é mais antiga do que imaginamos, e existe desde que passamos a transformar
a natureza para satisfazer nossas necessidades.
É a partir do trabalho, da transformação, que
a técnica surge e, por tecnologia, podemos entender qualquer mediador ou
ferramenta que sirva para atender uma necessidade, seja ela um punhal ou um
computador.
Assim, técnica e tecnologia são ontológicas
ao ser humano e fruto do acúmulo coletivo de conhecimento.
ALTERAÇÃO NO PROCESSO
DE TRABALHO
Segundo Marx, para aumentar o lucro (objetivo
central do capitalismo) é necessária uma elevação da força produtiva que, por
sua vez, significa uma alteração no processo de trabalho.
Esta alteração é realizada por meio de uma
mudança das condições técnicas e/ou sociais a fim de reduzir o tempo de
trabalho necessário, já que tempo é dinheiro para a produção de uma mercadoria.
Então, o desenvolvimento técnico ou tecnológico leva a redução do trabalho?
AUMENTO DA CARGA DE
TRABALHO
Não é incomum ter acesso a relatos de aumento
de carga de trabalho, porque o que acontece de fato é que um pequeno grupo
mantém seus empregos após uma restruturação produtiva, enquanto a maior parte
dos trabalhadores acabam desempregados ou realocados em postos de trabalho
precários.
Segundo dados da PNADC Contínua, se somarmos
a força de trabalho subutilizada – que engloba desempregados, subocupados e a
força de trabalho potencial – ao contingente de trabalhadores informais,
chegaremos a mais de 66 milhões de brasileiros que estão desempregados ou em
postos de trabalhos precários, muitas vezes sem seus direitos garantidos.
Desde a crise de 2007/2008 o capitalismo
busca soluções para sua crise de acumulação, e uma das tentativas de saída é a
4ª Revolução Industrial com a Inteligência Artificial que, entre outras coisas,
permitirá que as máquinas tomem decisões de forma autônoma, trazendo consigo
implicações para o trabalho.
Essa mudança radical por uma automação
completa possivelmente não chegará sem a contribuição do trabalho digital, ou
seja, há uma mão de obra humana invisibilizada necessária para produzir a
inteligência artificial.
Milhares de pessoas no Sul Global trabalham
para conglomerados do Norte ensinando máquinas a realizar tarefas e pelas quais
recebem uma miséria por atividade realizada.
CAPITALISMO DE
PLATAFORMA
Além disso, o capitalismo de plataforma, uma
nova forma de organizar o trabalho já tão fragmentado, garante a
operacionalização do trabalho sob demanda, cujo autogerenciamento subordinado e
controlado de forma centralizada por mecanismos obscuros – mas extremamente
eficazes na gestão racionalizada de trabalhadores informais, por vezes
descentralizados – aprofundam a desigualdade.
Só que essa organização não se restringe
apenas aos aplicativos e determinados setores; o que assistíamos é uma
tendência de transformar trabalhadores em prestadores de serviço, em uma
relação de trabalho frágil e permanentemente instável.
O CoronaChoque atingiu o mundo de forma
avassaladora e acelerou as mudanças já em curso a décadas. Assim, o trabalho
remoto repentino transferiu riscos e custos para a classe trabalhadora; o tempo
de trabalho e não trabalho foi borrado, o espaço de labor e descanso
mimetizados.
Mudanças de hábitos e resistências a modelos
digitais estão sendo superadas por parte da população. O capitalismo se
apropria das formas de resistências de maneira perversa e refinada: agora você
é livre para administrar seu tempo e espaço, mas é pago por resultado e metas
atingidas.
As constantes transformações no processo
produtivo são inerentes ao próprio sistema capitalista, já que as crises fazem
parte de suas leis intrínsecas de funcionamento.
A tecnologia nessa lógica que persegue o
lucro serve para aumentar o controle sobre o trabalho e, assim, reduzir os
custos de produção, superar as crises sistêmicas e acelerar o retorno do
capital.
FASE DE TRANSIÇÃO
O desenvolvimento tecnológico não acontece de
forma autônoma da organização social que está inserido. Tudo indica que vivemos
uma fase de transição do modo de produção, e por estar experienciando essa
mudança, por vezes, é difícil identificar ao certo suas implicações e
desdobramentos.
Porém, o elemento chave para a compreensão
deste contexto é recordar uma característica fundamental do capitalismo: a
propriedade privada dos meios de produção.
Se a tecnologia fosse um bem comum e não uma
propriedade de poucos usada prioritariamente aos interesses do capital,
permitiria garantir a produção adequada para o atendimento das necessidades
humanas e a redução significativa da jornada de trabalho, sobrando tempo para
nos realizarmos enquanto seres humanos de forma mais plena. Precisamos lutar
por um futuro onde o trabalho seja meio de emancipação e não servidão.
*Cristiane
Ganaka é economista, bacharel em ciências e humanidades pela Universidade
Federal do ABC e pesquisadora do Instituto Tricontinental de Pesquisa Social.
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